sexta-feira, 29 de outubro de 2010
Um texto que não era para ser texto
Tenho aprendido que, se o "excesso de espiritualidade" de pentecostais pode servir como esconderijo de deficiência da mesma, igualmente acontece com o excesso de rigidez em questões doutrinárias e teológicas. Um peca pra mais, outro peca pra menos. Mas a verdade é que se colocados numa balança, poucos são os que se salvam. Como disse Paul Washer, é possível viver um suposto cristianismo sem Cristo. Nosso orgulho pode ser tão grande que diante de uma multidão de pessoas eu poderia me julgar suja, pecadora, necessitada de Deus, simplesmente por saber que esse é o certo a se fazer, não por de fato me sentir assim. De modo que até o meu auto-esvaziamento pode ser motivado por desejos de aceitação ou admiração.
A verdade é que acabei passando muito tempo tentando corrigir o que de errado via nos outros, nas igrejas, nas doutrinas, na ortodoxia e deixando de lado a vida simples de um cristão que ajuda e exorta a quem Deus coloca diante dEle, o cristão que não sai obcecado correndo atrás de sarna pra se coçar. O fanatismo religioso faz com que criemos mais inimigos e divisões do que qualquer outra coisa, e pior ainda, fundamentamos com as Escrituras. Fazer a diferença, se manifestar, não é o mesmo que criar reboliços. Entre refutar ou amar, agora escolhi amar: constrange mais a outra pessoa e eu não deixo de exortá-la.
O fanatismo pelo conhecimento tem sido tão exarcebado que escrevendo isso aqui eu tenho sérias convicções de que comentários indignados poderão ser postados e acusações como "você está menosprezando as Escrituras" podem ser feitas. Mas de antemão eu respondo: não estou menosprezando, estou tentando viver. Mais difícil é aceitar e amar quem não concorda comigo do que seguir a risca uma linha doutrinária. Não posso dizer, por exemplo, que uma mulher pode pregar que dias de discussões e estresse serão gerados. Não posso me colocar a favor do cessacionismo ou do parcelamento de derramamento do Espírito Santo que um irmão batista e um pentecostal ficarão "de mal" comigo.
O dom de compreensão das Escrituras tem que nos fazer viver a mesma, não colocá-la como 10 requisitos básicos para alguém ser considerado um cristão de verdade (dá-se o nome de ortodoxia a isto). É importante a doutrina? Sim, mas a sã, não a nossa. E a sã se preocupa muito mais com a vivência do preceito de amor e preocupação com o outro do que uma vida trancado no quarto buscando tanto conhecimento que nem a oportunidade de praticá-los se tem.
Pergunte a si próprio, se você é um desses tarados por letra: o que toma mais o teu coração é tentar viver como a Igreja primitiva onde tudo era de todos e nada era exclusivamente seu, ou encontrar a divina refutação pra calvinismo ou arminianismo (ou o que quer que seja polêmico)? É mais fácil ocupar a mente com estas segundas questões sem uma definitiva resposta, do que ficar pensando em tudo que você realmente pode fazer e não faz.
Não sei se foi coincidência, mas nesse meu último mês de séria correção do Papai, ocorreram alguns fatos que me fizeram pensar. As duas últimas pregações que assisti foram de pessoas em que julguei fracas biblicamente (no sentindo de teologia) e, no entanto, ao subirem no púlpito pregaram de maneira absurdamente linda e como "brinde" a conversão considerável de pessoas que não cabe a algum de nós sequer pensar se verdadeiras ou não. Senti, então, um enorme arrependimento e vergonha pelo desprezo que inconscientemente apliquei sobre elas quando soube que pregariam. Preconceito que adquiri por frases mal ditas, ideias mal expressadas. Percebi que se tinha alguém mal ali, esse alguém era eu que fiz com que minha "crença correta" julgasse quem era digno de pregar ou não.
A idolatria pelo conhecimento te afasta da zona de ação, do meio em que você deveria estar: junto e absolutamente misturado com os leigos. Essa idolatria te faz criar um círculo de amizades onde é preciso demonstrar cacife teológico para fazer parte. No entanto, foi exatamente com leigos que Jesus escolheu lidar. Foi com os desprovidos de tudo, inclusive conhecimento. Jesus não tinha perguntas a fazer do tipo "você crê em livre-arbítrio?", não, não era com isso que gastava seu tempo. Essa idolatria eu tive, e posso dizer, se lesse esse texto naquele não distante tempo, nada seria cabível a mim. Sabe por quê? Porque saber que aceitar e me relacionar verdadeiramente com todos era o correto me bastava. Se alguém chegasse até mim, não o deixaria falando sozinho, porém, não moveria uma palha para mantê-lo perto tanto quanto moveria pra manter quem pra mim era digno da minha atenção (os que entendiam).
Lendo A Bacia das Almas, Paulo Brabo me disse algo verdadeiro: nós selecionamos quem tem algo a nos oferecer para amar e dedicar tempo. Se você não entende de bíblia, não tem opiniões doutrinárias/teológicas/ideológicas sobre nenhum dos assuntos cruciais a fé cristã (como poder ou não beber cerveja ou usar camisinha), logo, não tenho porque ansear estar perto de você. Se tudo der certo, talvez a gente coma junto um cachorro quente depois da igreja enquanto faço uma roda envolta daquele teólogo sabido.
Enfim, isso aqui não era um texto e também não era para vir pro blog. São 03:08 da manhã e preciso muito dormir. A mensagem central é esta: viver o evangelho é não acumular nada que só possa beneficiar a você e que não vá mudar a vida de mais ninguém. Priorizar a opinião da pessoa mais do que a própria pessoa não vem de Cristo.
Paz e muito amor a todos os meus irmãos!
7 comentários:
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Muito legal!
ResponderExcluirSabe aquelas vezes em que você está estudando a Bíblia e dá uma vontade de ligar pra alguém só para compartilhar e contar pra todo mundo que aparece na sua frente o que você acabou de descobrir? Esse é o espírito!
Paz!
Vc cresceu Bela...
ResponderExcluirO nome disso é humanidade, o Senhor te fez mais humana.
Quando falo em minhas pregações que o grande desafio do ser-humano é SER HUMANO NÃO FALO COMO BRINCADEIRA. temos dificuldade de sermos humanos pq desejamos ser espirituais.
O evangelho sempre foi humano e o Dono do evangelho mais humano ainda.
Bella,
ResponderExcluirEstou muito feliz com o que acabei de ler, pois tem muito haver com que o Espírito Santo tem falado ao meu coração.
Gostaria de elogiar não o texto e sim o seu coração que conseguiu em meio tudo isso que estamos vivendo ter a sensibilidade de ouvir e entender o Espírito.
Que o Espírito Santo nos capacite a viver a plenitude da graça, que o conhecimento da palavra transforme a nossa vida tirando de nós toda altivez, toda soberba e arrogância e nos faça iguais a Cristo em amor, humildade, paz, simplicidade....
“O Senhor te abençoe e te guarde; O Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti, e tenha misericórdia de ti; O Senhor sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz”.
Ruy Rodrigues.
Bella,
ResponderExcluirNaquele domingo, dia 17, quando estávamos voltando da praia e tivemos aquela ligeira "discussão" no carro, eu, Lívia, você, Quilion e Lenon, era exatamente sobre isso que eu estava falando. E na verdade eu falava, não por vocês, mas por mim, compartilhando um conflito constante e diário em minha vida. Já andei nos dois extremos, e hoje vivo neste conflito, dando a cada momento uma pincelada em um dos lados, mas depois de tal pincelada vem uma compreensão melhor do conflito que atualmente vivo. Mas é claro que as Escrituras nos mostram sobre a militância da carne contra o Espírito, e do Espírito contra a carne. Busco em oração ao Senhor, crendo que a cada dia mais o Espírito vença e Cristo seja revelado cada vez mais em mim.
Quando vamos escrever um texto, recheamos ele do começo ao fim com passagens para embasar o que estamos expondo ou defendendo. Neste texto você sequer usou um versículo, MAS TEM BÍBLIA NELE DO COMEÇO AO FIM.
Como sempre digo, mas nem sempre aplico, que o AMOR e a GRAÇA de Cristo em nossas vidas seja maior do que toda e qualquer convicção doutrinária que temos.
No mais, Graça e Paz!
Esse texto, ou/não texto é uma super reflexão dos anseios de um ser humano pecador com todos nos!
ResponderExcluire os fatos citados se encaixa a qualquer um que (entenda) o que foi proposto a cima...
o Julgamento a leio, fazer o Bem OLHANDO a quem, a vontade Humana de se libertar SEM PECAR, enfim...
Coisas que todos sentimos mas temos VERGONHA de admitir com medo do que pode pensar de você.
Essa Matemática abstrata da Balança citada a cima nunca vai ser exata, pelo simples fato de que cada ser pensante nesse grande universo tem o seu PONTO de vista.
E nenhum Homosapens é sapens o suficiente pra ser o dono da razão!
FÉ no que se crer (pra mim) basta!
Bella,
ResponderExcluirQue Deus continue te abençoando muito, pois essa é a essência do evangelho que Jesus pregava "amar o próximo como a ti mesmo".
Costumo dizer uma coisa que as vezes as pessoas não entende: O EVANGELHO É SIMPLES, AS PESSOAS É QUE COMPLICAM.
Que esse evangelho vivo e simples continue te colocando no alvo certo que é Jesus.
PAZ,
Bruno Gomes
Sra. Iza Quillon, a bella....
ResponderExcluirme fez sentir com 18 anos, muita sede, e pouca água.... o tempo passou, passará para vc(s) também. Daqui uns anos discutirão não por aquilo que é certo ou errado, não pelo prazer de discutir e ter razão. Mas pelo amor a Deus e a sã doutrina. Livres de amarguras... livres do desejo de ser, por que saberão quem sois.
Se cada dia cai,
dentro da noite
há um poço
onde a luz fica aprisionada
há que sentar-se
a beira do poço
e pescar luz
com paciência.
Neruda.